After Life

Já ensaiei várias vezes o que eu escreveria ao encerrar esse espaço que me acompanhou por tanto tempo. Comecei inúmeras vezes uma despedida, deletava e retornava à página em branco, mas o fato é que esse blog e tudo que ele significava não faz mais muito sentido nessa minha vida atual. Acredito que a gente viva várias vidas mesmo que em pouco tempo e a chavezinha temporal começou a girar para mim. Estou salvando e backupeando tudo e em breve abrirei um novo espaço, um tanto distinto. Em meio à pandemia do Covid-19 e ao desgoverno surreal fascista sinto que preciso de novos ares digitais.

Agradeço às inúmeras pessoas que passaram por aqui – muitas foram e vieram, outras ficaram –  mas certos ciclos precisam ser encerrados para que novos projetos floresçam. A lot like life. Obrigada mesmo a todos que me leram, que acompanharam minhas digressões musicais, acadêmicas e sentimentais. Assim que tudo estiver reconfigurado, aviso por aqui.

Até breve e obrigada pelos peixes.

I just want to turn the lights on
in these volatile times
I just want to turn the lights on
in these volatile (volatile) times

 

I’ve never been an extrovert but I’m still breathing

We were tight
But it falls apart
As silver turns to blue
Waxing with a candlelight
And burning just for you
Allocate your sentiment
And stick it in a box
I’ve never been an extrovert
But I’m still breathing

Fazia tempo que eu não tinha um setembro tão intenso, a última semana então foi quase devastadora de tantas coisas em todos os sentidos possíveis. Novos desafios no trabalho que já começam amanhã; um evento ótimo com as alunas do PPG que serviu pra medir o caminho que estamos seguindo e nos encheu de ideias; a primeira parte de um workshop em que tentei sintetizar dicas que acumulei ao longo de uns 17 anos de carreira; a perda repentina de um amigo de um período bem conturbado da juventude me fez rever memórias e posicionamentos (ir a um velório e rever pessoas das cenas musicais que eu não via há tanto tempo me fez lembrar um pouco de quem fui e quem sou); e o sábado chegou com os ventos da mudança de estação em que tudo que planejei meio que se desfez com a inevitabilidade da vida mais uma vez: um acidente besta em um jogo de futebol e o pulso do marido se quebrou, ajuda e atendimento feito tomei meu rumo pra reencontrar as amigas em um protesto, algo inimaginável não fossem as atuais circunstâncias…. e essa lista é um mero resumo ilustrativo porque setembro foi mais.

Stuck inside the circumstances
Lonely at the top
I’ve always been an introvert
Happily bleeding

Tudo isso serviu para uma pequena pausa nesse domingo em que pude recolocar algumas coisas em perspectiva. A próxima semana não parece ser menos fácil com documentações de projeto, aulas e outros quetais do cotidiano. Ao menos teremos um Outubro com Peter Murphy feat David J e Nick Cave – se tudo der certo – , amigos de outro estado e comemoração antecipada de aniversário de namoro. A promessa de um final de mês com Samhaim (Halloween) renovando as energias me anima e me lembra de que tudo, absolutamente tudo é efêmero. O importante é se concentrar em respirar para continuar viva, o que não é pouco.

And 1 4 2 9 7 8
Feels like I’m gonna suffocate
14 16 22
This skin that turns to blister blue
Shoulders toes and knees
I’m 36 degrees
Shoulders toes and knees
I’m 36 degrees
Shoulder toes and knees
I’m 36 degrees
Shoulders toes and knees
I’m 36 degrees

Amanhã seremos pó de estrelas

I’ve got this funny feeling that I just can’t shake
The devil in the wires, the data eating up my brain
There’s a flood that’s coming up to my bed
Chaos wins and I can’t get over it
How do I even learn to play the human way?
Smiles without a heart, weird mechanical mistakes
There’s a flood that’s coming up to my bed
Love’s out there but I’m indifferent

A última semana foi difícil. A morte súbita de uma colega de outra universidade, apenas seis anos mais velha do que eu, ligou aquele pisca-alerta que vem me acometendo há algum tempo. Ai entro naquele ciclo pensando na vida, na morte, no que fica, em legados, significados, no que se vive, no que se deixa pra trás e no quanto me importo cada vez menos com tudo isso. Tudo o que fiquei anos a fio construindo e que meio que me possuiu durante uma parcela enorme da minha assim chamada vida adulta.

Stand up can you keep your head?
Love me like tomorrow we’re dead

Ai hoje me deparo com o desabafo da Maira Nunes, num post bastante pessoal intitulado Não me chame de guerreira, expondo algumas das agruras e sofrimentos existenciais ao terminar sua tese de doutorado. Minha experiência foi muito diferente da dela. Eu amei escrever minha tese. Meu contexto era bastante distinto, tinha 20 e poucos anos, era solteira, morava na casa dos meus pais sendo sempre atendida, era bolsista e ainda tive a oportunidade de ir para o doutorado-sanduiche no exterior. Passei trabalho? Tive meus momentos difíceis? Com certeza, mas nem se compara ao relato dela.

Tive o privilégio de me acertar com a Academia de uma forma relativamente rápida, o que não me preparou para o que viria na seqüência e nem para o quanto de energia seria necessária e o quanto de desgaste seriam advindos de algumas práticas que hoje encaro como bastante nocivas. Não gostaria que esse texto fosse compreendido como uma mera reclamação, não é. Minha carreira e a vida acadêmica me trouxeram algumas das coisas mais legais: conhecer outras culturas; aprender, mediar e compartilhar conhecimentos, orientandos que me enchem de orgulho e vários colegas que se tornaram amigos em diálogos que extrapolam os ambientes institucionais e que me ensinaram muito sobre a vida e tudo mais. Eu realmente gosto muito do que eu faço, mas o fato é que há assim algo de podre no reino da Academia. Pessoas estão adoecendo, estão exagerando na dose e se afundando na carreira como um substituto para sabe-se lá o que estejam procurando. Eu sei por experiência própria, pois já fiz muito isso. Hoje procuro me policiar em algumas questões. O texto da Maira, vai além da questão acadêmica e sim da condição da mulher e das pressões que sofremos a cada dia. Não vou falar disso hoje, fica para uma próxima, pois há muito a discutir.

Beauty, violence
War is within us
We’ll be silenced
Tomorrow we’re gonna be stardust

No more ego
Nothing to control us
Painless freedom
Tomorrow we’re gonna be stardust

No entanto, provocada pelo texto que fala em perdas, gostaria apenas de contar a respeito mais um fracasso e como esse causo me fez recolocar a vida em perspectiva. Muitas pessoas desconhecem nossas batalhas internas e desconhecem as dificuldades na jornada. No início do ano tive um dos piores momentos da minha trajetória profissional, um dissabor grande que gerou um momento de confronto intenso. Foram alguns dias de revolta e aquela sensação acachapante de fracasso e o pior, de um belicismo personalizado travestido de resposta teórica que veio descrita em uma insistência por uma objetividade positivista misturada com um pensar pequeno e imediatista que me trouxe calafrios de horror, tudo aquilo ao qual eu me oponho. Por uns dias oscilei entre a fúria, a raiva, o desgosto e a vontade de abandonar tudo.

It’s pulling me apart a little piece by piece
Paradox and loss are knocking me off my feet
And there’s a flood that’s coming up to my bed
It’s a lose-lose world and I can’t stomach it
I wanna turn it all around in a volte-face
Eternally recurring, oh yeah put me in a trance
And there’s a flood that’s coming up to my bed
Love’s out there and I can’t stomach it

Depois disso veio a tristeza e uma sensação de melancolia e incompreensão por parte de outrem. Passados mais alguns dias e 2 sessões de terapia depois, comecei a me recompor ao ver que uns dias antes de tudo isso eu estava muito animada e feliz em 2 festas de casamentos: uma na qual fui madrinha de meu amigo mais antigo e a outra em família na festa da minha sobrinha que ecoou muito a felicidade do meu próprio casamento.  Também me dei conta que não fiz o que a maioria faz, me culpar por ter me divertido em pleno verão, enquanto deveria ter me ocupado em uma argumentação retórica que agradasse a determinados interlocutores. Relembrei que amargura não combinava comigo e que aquele tipo de agressão definitivamente tinha outra origem, anterior a mim, embora tenha sido dirigida a minha “persona profissional”.

Beauty, violence
War is within us
We’ll be silenced
Tomorrow we’re gonna be stardust
No more ego
Nothing to control us
Painless freedom
Tomorrow we’re gonna be stardust

Stand up can you keep your head?
Love me like tomorrow we’re dead

Desse processo ficaram algumas lições. A primeira delas é que a universidade tem amplificado por demais o número de pessoas infelizes e mal resolvidas  que agridem a quem não conseguem compreender, a quem não conseguem capturar em suas “bolhas” e caixinhas teóricas e de brodagem, por mais que seus discursos sejam aparentemente “progressistas”, iluminados e chamem os políticos de “golpistas” para capitalizar socialmente nas redes sociais da vida.

A outra lição é que a maioria das pessoas continuará cegamente agindo nesse moedor de carne estilo The Wall do Pink Floyd, mesmo quando a vida dá claros sinais de que as coisas não estão bem, que há algo de errado nas estruturas e está afetando a vida em sociedade. Elas continuarão lá endossando o discurso workaholic, falando que está tudo bem, jogando as próprias falhas  e o que não funciona para debaixo do tapete. Há um silenciamento profundo sobre os transtornos mentais, sobre a “vida lá fora”, sobre os pequenos fracassos e insucessos cotidianos.

Em meio a tudo isso, tive um insight em que pude compreender que meu caminho é distinto. Minhas escolhas devem sim ser outras. Consegui visualizar algo que sempre me acompanhou, mas dessa vez a uma distância quase na beira do penhasco, de que alguns modelos não são nem devem ser tomados como universais, os ambientes não devem te definir. Nunca me encaixei em nada, porque aos 42 anos iria me adequar?

E desculpa ai, mas o que significa um cargo administrativo cheio de regras e imposições frente a ter tocado na mão do melhor performer de sua geração no meio do moshpit de sua London town. Deixo aos burocratas e defensores do moral highground epistemológico, vigilantes do que é ou não é tal conceito, do que é ou não profundo/superficial, minhas condolências e meu solene dedo do meio em riste. Afinal “amanhã seremos pó de estrelas”.

Sobre artigos e textões: algumas notas de intersecção

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Há uns dias a Dora Steimer publicou na TL dela um texto intitulado “A prolixidade dos pesquisadores brasileiros, ou, “escreva muito para mostrar que sabe” escrito por Paulla Pereira. A autora, bibliotecária e mestre em ciências da informação levanta alguns pontos críticos interessantes sobre a forma da escrita acadêmica no Brasil – mas não acho que seja uma exclusividade nossa, embora tenha um forte viés da questão da língua portuguesa e de como estruturamos nosso pensamento e as influências principais da academia brasileira nas humanidades – ponto pra discutir outro dia. Uns dias antes eu havia lido essa entrevista do Nick Sousanis , “Barreiras da academia são de linguagem e não de inteligência” autor de uma tese de doutorado em quadrinhos que esteve no Brasil recentemente (o livro, Desaplanar está na minha pilha de leituras mas ainda não consegui tempo para lê-lo). Entre esses dois textos há alguns pontos de contato bem interessantes, mesmo que as formas de abordagem e o conteúdo sejam diferentes, ambos tocam em um buraco que me incomoda bastante na Academia em certos momentos: a linguagem ou o modo como muitas pessoas obscurecem a linguagem para um não-entendimento fora de um certo circuito de pares. Ambos os textos ficaram ecoando aqui na minha mente, mas só hoje, ao voltar de um par de horas na emergência traumatológica (minha fasceite plantar voltou e não está sendo fácil) tive tempo pra rascunhar algumas ideias.

Nos últimos meses  participei de muitas bancas de qualificação e defesas de dissertações de mestrado e teses de doutorado em várias universidades, na área da comunicação, na Literatura e até na Psicologia Social e observei alguns fenômenos interessantes no sentido do formato do texto acadêmico. No lado positivo, pessoas tentando escrever de uma forma mais clara, leve e objetiva trazendo elementos do cotidiano e analogias com linguagens da cultura internética. Por outro lado, ainda uma devoção ao tentar emular Deleuze e “outros grandes” teóricos de uma forma que o texto fica quase ilegível para não-iniciados.

O texto de Paulla sobre a prolixidade inicia pela questão do tamanho/número de páginas/palavras indicando que um artigo não precisa necessariamente ter 15 páginas para ser um bom artigo e que há muita prolixidade. Concordo em muitos pontos com a autora, mas acredito que essa seja apenas uma pontinha desse iceberg (a problemática da mistura das fontes tem sido pra mim chocante, mas falarei disso outro dia). Um dos pontos centrais para mim é a questão das diferenças entre um formato ensaístico e um formato mais voltado ao relato dos resultados de pesquisa. Há também toda uma problemática na forma como os periódicos nacionais e estrangeiros demandam tipos de escritas diferentes. Percebo que há uma dificuldade de muitos colegas mais acostumados a uma formação ensaística com o embate em revistas que privilegiam resultados sistematizados. Enfim, a discussão vai longe.

henribook

Acredito que as emulações de linguagem buscadas por autores-fãs de teóricos que muitas vezes querem repetir o estilo de seus ídolos seja uma das piores coisas que possa acontecer para qualquer artigo/tese/dissertação. Em vez de ir em busca de sua própria voz, a pessoa quer recortar e colar um palavreado que ela “acha bonito” ou que daria uma densidade e que muito provavelmente retirado de um determinado contexto não faça o menor sentido quando aplicado no fenômeno/campo empírico mais atual, se tornando uma grande forçação de barra tipo certa vez (la pelos idos de 2006) em que vi um projeto de um candidato a mestrado que queria “usar Nietzsche para estudar rádios comunitárias”. Isso poderia ser um projeto interessante? Até poderia. Mas o esforço de operacionalizar uma análise nietzscheana a um objeto desse porte precisaria passar por camadas de outros autores e talvez não levasse a uma reflexão que indicasse resultados novos e se perdesse em um discurso circular/aforístico fora de contexto. Imagino o que véio Frederico acharia disso, mas de qualquer forma isso é mera especulação e o tal candidato não passou na seleção naquele ano. Um outro problema é pegar um conceito consolidado por autores estrangeiros e tentar “aplicar” sem nenhuma mediação em um contexto nacional . Discutir sobre trollagem na internet por exemplo, boa parte da literatura estrangeira vai relacionar o termo ao cyberbullying. No contexto da cultura da internet no Brasil há outros significados vinculados à zombaria humorística.

Por outro lado, uma questão conceitual é muitas vezes um emaranhado de significados de palavras, uma teia de sentido que precisa ser desvendada historica, social e filologicamente, dificultando o trabalho dos autores em suas explicações. Fenômenos complexos não resistem a 140 caracteres ou ao formato comentários no Facebook. De toda forma, é preciso sim explicar melhor, escrever de forma mais precisa, mais descritiva (no bom sentido) e menos empolada sem deixar a profundidade de lado.  O que descamba para um outro aspecto negativo que tenho observado recentemente, o da adjetivação ou do uso excessivo de coloquialismos do senso comum. Em outra esfera, observo também muitas apropriações de jargões acadêmicos como problematizar, desconstrução, entre outros como uma espécie de mera ostentação lingüística  utilizada em vários dos textões postados no FB que soam fora de lugar ou anacrônicos para esse tipo de ambiente (ok, vai ver eu sou a chata que enxerga trabalho 24/7 onde as pessoas vêem lacração e ativismo em forma de tentativa de commodity acadêmico). Eu sei, há muitas defesas possíveis em relação aos textões, mas peguei o gancho do texto da Paulla e da entrevista do Sousanis para dizer que certos tipos de textões também criam mais barreiras em vez de gerar pontes.

Assim, bem de canto de olho diria que enquanto há uma tendência para que o texto acadêmico se transforme e revise sua linguagem para um formato mais compreensível  para a leitura e condense melhor suas ideias centrais/teses; há uma outra tendência cujo valor é justamente tomar de empréstimo conceitos que são discutidos há anos para gerar valor performativo em textões de SRS e construir uma narrativa de si que simule uma teorização mas que não precise responder por ela entre os pares. Talvez haja uma interessante intersecção desses formatos (o artigo e o textão) que precisa ser avaliada de forma diacrônica  e genealógica. Ou para simplificar quando foi que o textão de redes social virou pseudo-ensaio acadêmico e o texto acadêmico começou a tentar negar suas origens e se tornar mais pop?

Para mim, o mais difícil é sempre o caminho do meio, o bom senso no tom. Complexidade e leveza não são fáceis de atingir, mas concordo com Sousanis, é preciso desenhar mais, explicar de forma mais sintética, é preciso dar mais sonoridade ao texto acadêmico sem que ele vire uma poesia ruim ou um mero devaneio como observamos muitas vezes por ai.

“And it’s a long, long way (long way). From where you want to be”

2017 está transcorrendo de forma vertiginosa. Perdi a conta de quantas vezes quis retornar a esse espaço pra escrever algumas linhas e desovar algumas ideias meio desconexas. Fazia tempo que não tinha um semestre tão denso e com tanto por fazer.  Apesar das dificuldades e do excesso de trabalho posso destacar alguns pontos bem positivos (totalmente fora de ordem):

  • Show do Slowdive em SP em maio;
  • A chegada da baby Ororo, mais uma gatinha preta resgatada das ruas e que integra a família Amaral-Salvatore;
  • Filme da Mulher-Maravilha no qual chorei pra caramba de emoção – que me rendeu um texto para o jornal Zero Hora e uma entrevista pra Rádio Unisinos FM. (Das coisas que me rendem orgulho escrever e falar sobre Diana Prince estão no topo, mataria meu pai que era muito fã da personagem de orgulho #complexodeelektrafeelings );
  • Participação no simpósio Fantástico Brasileiro: Produção Literária e Mercado Editorial organizado pelo queridíssimo Eneias Tavares e que trouxe os melhores escritores, editores, tradudores do “movimento fantasista” (MANTAGRANO, 2017) do Brasil a POA (foi maravilhoso reencontrar todo esse povo);
  • Ver impresso meu Prefácio à nova tradução (da queridona Carol Chiovatto) de Orgulho & Preconceito da tia Jane Austen que saiu pela Giz Editorial;
  • Vice-coordenação do GT Estudos de Som e Música na Compós 2017 na Cásper Líbero em SP (o que possibilitou que eu encontrasse o querido casal whovian Thais Aux & Freddy Pavão e batesse um papo com a lindona Edi Fortini, rever amigos e a família paulistana é sempre um bom motivo pra ir àquela terra);
  • Organização – junto com a equipe do CULTPOP – do V CoMusica – Congresso de Comunicação e Música que vai rolar na Unisinos dias 01, 02 e 03 de Agosto de 2017.
  • Nova orientanda de Pós-Doutorado, Lucina Viana

Em meio a todo esse volume de atividades, a vida vai acontecendo entre altos e baixos, dias com saúde e dias mais abalados, encontros com amigos, desabafos, chateações, tédio, pequenas alegrias, amor, crise política no país e no mundo, problemas familiares, questões identitárias que nunca se consolidam – e a gente acha que com 40 já ia estar tudo resolvido né? Santa ingenuidade. Contudo, seguimos, mesmo ainda longe de onde pretendemos estar (it´s a long long way) vamos respirando e tentando localizar alguns pontos de respiro e desconexão. Que o segundo semestre seja mais leve!

Simpósio Mapeando Cenas da Música Pop: Cidades, Mediações, Arquivos

simposio

Nos dias 25 e 26 de agosto (quinta e sexta) vai rolar na Escola da Indústria Criativa da  Unisinos campus São Leopoldo o simpósio Mapeando Cenas da Música Pop: Cidades, Mediações, Arquivos. O evento é parte do projeto POA MUSIC SCENES, desenvolvido pela Unisinos em associação com a Universidade de Salford, na Inglaterra e organizado pelos grupos de pesquisa CULTPOP – Cultura Pop, Comunicação e Tecnologias e TCAV – TecnoCultura e Audiovisual.

Durante os dois dias, serão discutidos diversos temas que envolvem a relação entre música pop, sociedade, memória e experiência. A programação começa na quinta às 13h30 com apresentação do documentário sobre mulheres bateristas no Rio Grande do Sul, segue às 14h, com debates sobre as cenas musicais contemporâneas do Rio Grande do Sul e circulação musical em redes sociais. Às 18h30, os coordenadores do POA MUSIC SCENES discutirão os resultados da pesquisa. Às 19h30, haverá palestra da professora Simone Pereira de Sá, da Universidade Federal Fluminense, sobre as cenas do funk carioca e os usos das tecnologias pela música pop periférica, fechando o primeiro dia.

Na sexta, às 10h, a fala inicial será do professor Michael Goddard, da Universidade de Salford. Ao longo da tarde, será discutida a relação entre cenas musicais e experiência urbana, com trabalhos que enfocam Porto Alegre e cidades como Rio, Goiânia e Berlim além de discussões sobre memória e arquivo. Às 16h30, uma mesa especial que reunirá produtores locais que discutirão as muitas facetas das cenas de rock e de música eletrônica da capital gaúcha. A entrada no evento é gratuita.

Confira a programação do simpósio: http://tinyurl.com/progpoams

FESTA
Na sexta à noite após o evento, é hora de tomar o caminho para Porto Alegre: às 21h, a festa POA/MCR/POA – Panamá (after) Papers, que acontecerá no Panamá Estúdio Pub, na Cidade Baixa, marca o fim do evento, com shows das bandas The Gentrificators e Moldragon, além de discotecagem que reunirá o melhor já produzido em POA e Manchester pelos integrantes da pesquisa. A entrada é franca. Evento no Facebook:https://www.facebook.com/events/1634221333555148/

LABTICS
O simpósio marcará também a inauguração do Laboratório de Tecnologias da Informação e da Comunicação do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Unisinos, o LABTICS – um moderno espaço com capacidade para sessenta pessoas que, entre outras características, possibilita transmissões via streaming de alta qualidade por meio de três câmeras de alta resolução operadas por controle remoto.
Mais informações pelo site http://www.poamusicscenes.com.br/ ou pelo email portoalegrems@gmail.com

Sobre desapontamentos & fracassos

Minhas últimas semanas foram algumas das mais difíceis dos últimos seis anos, perdendo apenas para quando meu pai e minha mãe faleceram. Quem convive com os ciclos de um transtorno de humor sabe muito bem que pode passar anos, mas um belo dia a crise volta a dar as caras. Ao longo do tempo a gente aprende – ou pelo menos tenta – evitar, já conhece alguns dos gatilhos, vai percebendo os caminhos que funcionam ou não. No entanto, nunca temos uma certeza se vamos conseguir nos manter no trilho da estabilidade/sanidade.

Did I disappoint you?
Did I let you down?
Did I stand on the shore
And watch you as you drowned?
Can you forgive me?
I never knew
The pain you carried
Deep inside of you.

E eis que nesses últimos dias estou tentando digerir um fracasso daqueles retumbantes, uma frustração gigantesca, uma derrota sem precedentes na minha vida ordinária. Não que eu tenha tido vitórias épicas, grandes prêmios ou algo digno de sei lá, uma olimpíada. Porém, na medida do possível, tento me organizar, tento planejar e sei la, boa parte das coisas andam a partir do momento em que eu mobilizo uma energia para aquela tarefa ou ao menos assim eu acreditava. De maneira geral tinha dado certo, até o presente momento. Em geral, nunca vemos as pessoas falando dos momentos em que falharam. A narrativa do sucesso é muito mais sedutora.

You only see what your eyes want to see
How can life be what you want it to be
You’re frozen
When your heart’s not open

O primeiro passo da dificuldade é admitir e aceitar que aquilo que você investiu todo um aparato emocional simplesmente não vai acontecer. Na teoria até parece fácil, você respira, inspira, deixa o tempo passar e mais umas outras técnicas ai. Na prática, a vontade é se enfiar embaixo das cobertas e não sair de la até a dor desaparecer. Só que o trabalho, as contas pra pagar, e tudo mais na vida não te permitem fazer isso. O máximo que você consegue é ficar ainda pior.

You’re so consumed with how much you get
You waste your time with hate and regret
You’re broken
When your heart’s not open

Ai você nem conseguiu superar ainda a primeira etapa e já começam as auto-cobranças do tipo: Por que eu fiz assim e não assado? Como foi que eu cheguei a isso?  Se eu tivesse escolhido A em vez de B, teria dado certo? Fulano consegue, por que não eu? São tantas as variáveis que você vai se sentindo soterrada e tudo em volta fica ainda pior. Raiva, arrependimento e um monte de incertezas começam a te tirar do chão e a te fazer acreditar que você não tem capacidade ou, nesse caso específico que nenhuma das suas capacidades é boa o suficiente pra te tirar dessa enrascada na qual você mesma se colocou. Me sinto afundando e preciso continuar a sorrir e a agir naturalmente.

I can’t forget
Having to see
The words that knocked the wind
Right out of me
It’s not enough
I’ve come undone
Trying to find sense
Where there is none

E ai depois de muitos dias ruminando e sofrendo muito – incluindo um dia que eu sempre gosto muito de celebrar e que mal tinha forças pra sair da cama, o meu aniversário – decidi voltar algumas casas no jogo. [Além da melancolia natural e de enfrentar o fato de estar fazendo 41 anos assim, num piscar de olhos, juro, eu nunca me senti com essa idade. Sempre me senti ageless.] Falar da perda é vivê-la novamente, mas também  o único jeito de expurgar o que já estava escrito e eu não quis ver.

I have a tale to tell
Sometimes it gets so hard to hide it well
I was not ready for the fall
Too blind to see the writing on the wall

Decidi pela primeira vez de forma consciente desistir de algo que eu queria muito e assumir que sim, eu fracassei e não vou mais insistir em tentar ir adiante com algo que só está me causando dor. Algo que não está nas minhas mãos nesse momento. Estou triste e desapontada comigo mesmo e com um conjunto de circunstâncias que de uma forma ou de outra me constituíram. “Eu sou eu e minhas circunstâncias”, aquela frase bem clichezona do Ortega Y Gasset. Mas é isso, acho que assumir que falhei já é um bom começo. É como eu posso tentar lidar com esse desgaste por hora. Infelizmente precisei sair de um impasse com uma escolha que é a menos pior. Não é o que eu desejava, não é o que eu queria ou como eu queria mas é como a vida me impôs e não há nada que eu possa fazer a não ser aceitar. Uma sensação de impotência indescritível, o que pra alguém acostumada a correr atrás de tudo até as ultimas conseqüências é aterrorizante.

Now there’s no point in placing the blame
And you should know I suffer the same
If I lose you
My heart will be broken
Love is a bird, she needs to fly
Let all the hurt inside of you die
You’re frozen
When your heart’s not open

Mas ai vão aparecendo alguns pequenos confortos: coisas legais de trabalho (fui convidada pra escrever uma espécie de prefácio pra um dos livros que eu mais gosto); amigos que desviam sua rota apenas porque você precisa conversar e vem na sua casa quando você mais precisa; a sobrinha que vem perguntar querendo saber de verdade como você está na inbox; o aniversário da Madonna que te faz escutar Frozen por horas no repeat e entender porque seu melhor amigo dizia pra prestar atenção nas letras; os bolsistas que estão trabalhando pelo evento de forma tão profissional; a saudade boa das festas e shows do ManRay Club em Harvard Square (Disappoint do Assemblage 23 era um hit); toda uma rede de afetividades que te lembram que nada é tão ruim que vá durar para sempre. Talvez desses grandes desapontamentos a gente tire alguma força inexplicável para seguir adiante. Ou como diria a musa Scarlet O´Hara: “Tomorrow is another day”

Don´t Panic

Meus últimos meses têm sido muito conturbados em termos profissionais, pessoais, familiares, etc, mas a partir dessa próxima semana em que retornam as aulas – e tem mais um aniversário pela frente-,  decidi que vou voltar a me disciplinar pra escrever no bloguinho que ficou ai abandonado novamente por uns meses [também estou me prometendo retomar os exercícios, fazer os exames pendentes, entre outras coisas que abandonei]. Na verdade estou tentando me disciplinar em alguns campos que andam defasados na vida. Tenho alguns pequenos posts já na cabeça: a experiência como professora/pesquisadora visitante na Alemanha entre maio e junho, os eventos na Inglaterra (sobre fãs e música brasileira), o seriado Jonathan Strange & Mr. Norrell, as mudanças no Instagram, a 6a temporada de Game of Thrones, minha vida de madrasta e outras aleatoriedades que podem ou não fazer sentido. Também preciso dar uma atualizada em uns artigos cujos links sumiram daqui. Primeiro fiz uma limpezona na minha casa física (escritório, quartinho da bagunça, etc), agora é hora de dar um jeito aqui.

Nessa altura do campeonato de ser adulta, apenas preciso comentar que fazia muito tempo em que não sentia tanto pânico: um medo atroz dos caminhos que me trouxeram até aqui, do que vem pela frente, do que se foi, do que virá e eu desconheço, medo de errar, medo de gente extremista em todos os espectros, medo de me arrepender, medo de ter mudado a ponto de não mais me reconhecer, medo de parecer sempre a mesma, medo de deixar algumas mágoas e ressentimentos tomarem conta e perder de vista a big picture, medo de surtar, medo de me esconder em camadas de precaução, medo de perder a mão, medo de não conseguir segurar as marimbas. Medo de ficar levando um 7 X 1 ad infinitum da vida. Todavia, simplesmente não posso deixar que todo esse  pânico me paralise, estamos ai, respirando e segurando nossa toalha pelas galáxias em busca de aventuras. Vamos repetir a frase clássica de Douglas Adams: “Don´t Panic”!

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Lápide do Escritor Douglas Adams no magnífico cemitério vitoriano HighGate Cemetery em Londres em um belo dia de sol. Crédito: Arquivo Pessoal Adri Amaral & Tarsis Salvatore

 

Sobre desistir, aleatoriedades e caos

Choose Life. Choose a job. Choose a career. Choose a family. Choose a fucking big television, choose washing machines, cars, compact disc players and electrical tin openers. Choose good health, low cholesterol, and dental insurance. Choose fixed interest mortgage repayments. Choose a starter home. Choose your friends. Choose leisurewear and matching luggage. Choose a three-piece suit on hire purchase in a range of fucking fabrics. Choose DIY and wondering who the fuck you are on Sunday morning. Choose sitting on that couch watching mind-numbing, spirit-crushing game shows, stuffing fucking junk food into your mouth. Choose rotting away at the end of it all, pissing your last in a miserable home, nothing more than an embarrassment to the selfish, fucked up brats you spawned to replace yourselves. Choose your future. Choose life… (Trainspotting)

Não se preocupem, esse post não é sobre desistir da vida. Também não vou jogar tudo para o alto e virar hippie (não nessa vida por favor, ninguém me obriga a usar sandalinha de couro e saião e cantar a detestável Janis Joplin. Mais facil eu enlouquecer em uma masmorra ou em uma fabrica abandonada ouvindo :wumpscut). Esse post é sobre algumas coisas que vieram a minha mente após ter lido o texto inquietante da Aline Andrade intitulado Quando chega a hora de desistir. Fiquei pensando o quão diametralmente oposta estou no espectro e, ao mesmo tempo tão próxima. A vida acadêmica e suas agruras é parecida e diferente para pessoas tão distintas e sim, renderia bons produtos ficcionais, sejam livros, seriados ou filmes. Eu sempre quis escrever um sitcom com as situações bizarras e surreais que já passei – e não foram, nem são, poucas. De qualquer forma essa é uma realidade ainda pouco explorada pela TV (atenção diretores e produtores da HBO, GNT etc temos material de sobra, #chamanóis).

No texto Aline descreve com bastante acuidade algumas situações que todo mundo que já fez concurso ou prestou seleções conhece ou já ouviu. A vida acadêmica é bastante randômica e aleatória, apesar de todo o discurso meritocrático e peer review que contamos para nós mesmos o tempo todo. O caos no fim das contas acaba determinando alguns acontecimentos muito mais do que as escolhas que acreditamos fazer.

Eu por exemplo, decidi que seria jornalista com sete anos de idade porque gostava de escrever e porque era fã dos repórteres heróis dos quadrinhos (Homem Aranha, Superman). Ao contrário de todos  meus colegas, durante o segundo grau (é ensino médio agora né? Acho que estou passando atestado de tiazona) eu não tinha nenhuma dúvida sobre qual graduação cursar. Mas meu último ano antes da faculdade foi caótico, aconteceram coisas que me tiraram do prumo e acabei fazendo um pouco de Letras, porque amava literatura de língua inglesa. Amava o curso (lingüística, teoria literária) mas não me via sendo professora. Olhem a ironia da vida. Hoje sou professora.

Um semestre depois entrei no jornalismo (levei ambos os cursos por um tempo mas não rolou) com a missão de trabalhar pra uma revista de música. Era esse meu ponto. Não tinha a menor vontade de escrever sobre buraco da rua, política (meu niilismo ja me fazia odiar ideologias de variados espectros) ou hard news. E la no andar do curso o que aconteceu? Primeiro que passei a gostar e andar com os amigos publicitários que ouviam música eletrônica – a maioria dos estudantes de jornalismo faziam a linha roqueirinho classico que naquele momento eu achava um saco –  e traziam novidades ao contrário dos colegas marxistas (rs)  que só reclamavam de tudo. Segundo, me tornei bolsista de IC e entrei num grupo de pesquisa em semiótica. Minha ideia era terminar o curso e ir para SP, achar meu lugar na “imprensa musical” (para a qual eu até frilei). No entanto, uma série de problemas familiares (doenças e um namorado que nunca se formava) me prenderam em POA.

Assim, um ano depois de formada eu efetivamente decidi entrar no Mestrado com a ideia de pesquisar cinema/audiovisual. Apresentei um artigo em um renomado congresso nacional específico da área sobre um filme que eu achava bacana, um filme cuja música era o epicentro. Ninguém comentou absolutamente nada sobre o meu texto, nem pra xingar, nem para fazer polêmica, nem para dizer que era um lixo. Foi uma deprê. Paralelo a isso eu trabalhava nessa área com alguns freelas e não me via passando a vida a debater sobre Glauber Rocha e outros cânones dessa área. Não era pra mim. Não foi consciente, mas retomei meu projeto de mestrado e acabei de uma forma um tanto tangencial falando sobre fãs. Um belo dia quando estava quase ao fim do mestrado (uma época muito difícil na minha vida pautada pela depressão e por uma sucessão de relacionamentos afetivos fracassados) decidi que tentaria o doutorado, afinal eu queria mesmo seguir na academia. Mesmo que nada estivesse dando muito certo naquele momento enquanto 60% dos meus colegas já dava aulas, tinha empregos no mercado e pareciam estar se encaminhando na vida.

Eis que num desses dias, Neuromancer do William Gibson cai na minha mão e assim surge meu projeto de doutorado. De forma completamente aleatória porque eu li algo sobre The Wanderer (uma canção do album obscuro Zooropa) e a relação dele com o livro e fui investigar. E assim entrei no doutorado, uma época igualmente complicada em que o país atravessava um período em que praticamente não haviam concursos em federais, tinham poucas bolsas, etc etc. Tudo muito diferente do cenário recente. Fiz doutorado com bolsa parcial , fazia freelas, traduções, me virava nos vinte e poucos enquanto meus colegas conseguiam empregos nas universidades particulares da região, compravam apartamentos, carros, viajavam nas férias de verão. Eu vivia uma vida com pouquíssima grana – não monástica porque não tenho menor vocação de não sair pra rua rs – e chegava a duvidar que conseguiria emplacar meu tema. Um dia, vou até a biblioteca e remexendo numa estante um livro da área de teoria literária literalmente cai no meu colo, um livro que continha um artigo que me ajudou a encontrar a hipótese da minha tese e que gerou um artigo com qual fui aceita pela primeira vez no congresso da Compós, que segundo diziam todos, era importante. Paralelo a isso, teve uma novela do doutorado-sanduiche em que eu quase não fui ( as bolsas eram muito escassas) e mais um monte de complicações que por si só dariam um livro, até coleguinha ironizando “pesquisar scifi” e burocracias que pareciam estar contra mim. No fim, acabei viajando e foi uma das melhores experiências que eu tive. Quando voltei ao Brasil começou a me bater o desespero, afinal o que eu faria da vida? Não haviam concursos, as contratações estavam escassas. O desespero batia a minha porta.

True life begins behind the border
That exists inside your head
You will never reach deep waters
And get away from there
Take a look around
And look at what you have
But you will never reach deep waters
If you do not change yourself

True Life – Lights of Euphoria

O fato é que defendi a tese e por mais uma dessas aleatoriedades da vida um mês depois disso estava em outra cidade, em outro estado, empregada em um PPG e morando junto com o namorado que na real eu conhecia muito pouco. Dali para adiante tudo estava resolvido? No way baby. Daquele dia em diante comecei a planejar a estar em um lugar melhor ou mesmo mais perto da familia e dos amigos. Apesar das dificuldades, fui sobrevivendo, criei redes com outros pesquisadores que admiro fora da cidade (aka centro do país) – , fiz amizades fora do circuito acadêmico, organizei festas, discotequei – e pasmem até ganhei alguns trocados com isso – enfim fiz um monte de coisas que alguns diziam não ser compatíveis com a “nova vida séria” que eu tinha. Fui julgada até porque usava uma pasta da Hello Kitty, o que convenhamos, nunca afetou minha produtividade #shoremhaters.

Enquanto isso, fui tocando as pesquisas e mirando num futuro, mirando em empregos melhores, trabalhando finais de semana, feriados, não tirava quase férias, tive 2 empregos por dois anos. Aos 34 anos e ao final do meu último ano naquela cidade obtive a Bolsa de Produtividade do CNPq. Mission almost accomplished.  Obviamente tudo tem um custo e minha vida emocional – sanidade mental + casamento + amizades + familia – flopou das mais variadas formas imagináveis com direito a mortes, doenças e separação. Eu tinha 30 e poucos anos e postergava quase tudo. Tem tempo, deixa pra depois, não é o momento, vou enfiar a cara nesses pareceres, vou dar um curso no interior de sei la onde, vou dar uma palestra nos confins do brazyu. E assim seguia.

Após inúmeras tentativas, finalmente consegui mudar de cidade/emprego (e não era só mudar de emprego né, era pra alguma cidade com a qual eu tivesse mais afinidade e rumar para um PPG mais renomado com mais nota e que me permitisse captar mais recursos em editais, e uma série de outros itens. A régua havia subido). Fiquei feliz, afinal, meu plano havia dado certo – do alto da minha arrogância dos 30 e poucos achava que sim tudo tinha seguido meu plano. Em compensação havia uma cratera no meu RV – como dizia Sherry Turkle nos anos 90 para falar sobre o plano da vida offline, o Resto de Vida. E ai começou toda uma nova saga. De la para cá se passaram seis anos. Perdi minha mãe, fui pra terapia, me separei, comprei um apartamento (o lado “sonho classe média” rs que 90% dos meus colegas realizaram quando ninguém me deu emprego na minha terra natal foi finalmente resolvido) casei novamente – dessa vez de um jeito totalmente diferente – e fiz um pósdoc onde eu queria, provavelmente em uma das ultimas levas de bolsas para o exterior desse período “rhykho” das agências.

Confesso que à exceção do pósdoc que ja estava em um planejamento, todo o resto foi absolutamente singular. E mesmo as circunstâncias que me levaram a ele, a escolha do lugar, de tudo, acabou se dando de forma caótica e randômica. Talvez porque ao contrário do que eu pensava, fui sim fazendo pequenas desistências, como no momento em que larguei de mão minhas intenções de pesquisar cinema e me joguei de cabeça nas questões da cibercultura e dei sorte de estar ali quando uma subárea de estudos se formava. Eu desisti de algo para fazer outro. Foi doloroso, mas sei la. É preciso perceber nossos limites.É o que tenho pensado em relação ao meu modo de encarar a vida cheio de metas e objetivos tracejados. Talvez eles me dêem uma falsa sensação de segurança e no momento, me sinto um poço de dúvidas e hesitações Sempre tive muitas certezas e agora não, desconfio de tudo no qual um dia acreditei.

Tudo isso apenas porque outras questões me atormentam e me fazem pensar em desistir a respeito de decisões anteriormente fechadas.Como falei no início do post,  minha “assim chamada” carreira já está mais ou menos delineada. – ok é dificil manter e à medida que o tempo passa outros objetivos vão surgindo mas as coisas estão constituídas. Também acredito que se um belo dia eu resolver sair disso, vou sair pela porta da frente e me jogar em algum outro abismo tendo certeza que dei minhas contribuições e elas foram suficientes para os meus propósitos.

O que trato aqui é sobre estar sempre pensando no desenho que “as vidas” da gente formam. Quando falo as vidas é porque não é uma só, são várias em um curto período de tempo. No meu caso, acho que foi o Pollock quem jogou umas tintas na tela, pois quando penso que está tudo estabilizado, algum lado  resolve berrar ardentemente. E assim, talvez eu  precise retroceder, relevar, deixar estar, rever o que deixei de lado e o que priorizei e ver que there´s no going back. Não é possível pegar uma TARDIS ou um De Lorean e voltar no tempo. O caos fez com que eu chegasse  até aqui e talvez ele não permita que eu altere algumas estruturas já definidas em um determinado ponto sem que se quebre alguns cristais. Como em Suedehead do Morrissey: “I´m so sorry”. Eu realmente sinto muito. Eu queria ter desistido antes, ter desistido a tempo de não perder o baile. Mas, talvez não haja tempo suficiente em uma única vida humana para que a gente consiga preencher a maior parte das lacunas  e dos desejos. Para um ego leonino e para alguém que odeia desistir – sou dessas que costuma ir até o fim –  talvez isso seja um aprendizado extremamente doloroso. Talvez desistir seja também resistir e encontrar algum tipo de paz. Ou talvez todo mundo seja só trollado o tempo todo por essa bitch chamada vida que vem cobrar os débitos que julgávamos já ter pago. Tem dias que eu acho que deixei a comanda do bar do vida pendurada 20 anos atrás e agora ela veio cobrar tudo de uma só vez . De qualquer forma desistir também é parte do amontoado de aleatoriedades sem sentido que construímos para nós mesmos e talvez até nos salve de sentir menos dor.

 

A ressurreição das práticas irritantes de pesquisa

Uns anos atrás publiquei um post sobre práticas acadêmicas irritantes. Esse post volta e meia traz pessoas ao blog, sobretudo depois que a Dora Garrido citou ele no seu blog há bem pouco tempo. O fato é que o assunto não se esgotou e aproveitando o espírito de ressurreição da Páscoa resolvi comentar mais algumas coisas que me incomodam quando leio trabalhos e que procuro, na medida do possível, evitar no meu trabalho.

  1. Linguagem – A velha questão forma e conteúdo. Ambos são importantes, mas o fato é que se um texto está muito truncado, ele atrapalha a leitura e o entendimento da complexidade da questão. Quanto mais o tempo passa, menos aprecio linguagem que tenta emular grandes autores. Filho, vc nunca será Foucault, Geertz, Kant, etc. Escreva com clareza, demonstre seus objetivos.Isso não quer dizer ser escolar ou excessivamente didático. Seja claro, seja leve. Erudição não significa colocar um monte de palavras obscuras, erudição é fazer boas conexões entre temáticas. Não exagere nos adjetivos publicitários e não escreva a profissão dos autores (isso é coisa de texto jornalístico), tipo Fulano de tal, sociólogo. Cuidado também para que o texto não seja informal demais. Na dúvida, vá no feijão com arroz (3a pessoa, frases curtas, etc), é melhor do que “fazer uma inovação” que vai soar como se você quisesse fazer o post de xoxo mídia engraçadalho. Isso quer dizer que você não pode experimentar? Claro que pode. Eu mesma adoro títulos bem humorados, mas é preciso achar um caminho do meio entre o seu estilo e as regras acadêmicas ou vai parecer forçado. Não force a mão para parecer um filósofo do século XIX e nem o hipster de rede social. Ache o seu caminho. Lembrem também que os avaliadores (pareceristas ou professores da banca) têm muita coisa para ler, quanto mais facilitado estiverem questões como objetivos, hipótese, problema de pesquisa, objeto, etc melhor é.
  2. Uso das fontes de pesquisa – Um cuidado que muitas vezes vejo subestimado é a questão das fontes. Não dá para misturar autores de diferentes correntes e fazer uma salada de fruta. Contextualizar é mais do que necessário. E, por vezes, sair do armário teórico também (no doutorado é um requisito). Existem tais e tais correntes, mas vamos seguir essa ou vamos fazer um combo de X + Y pelos motivos A, B e C. Uma explicação resolve. Outro fator que me incomoda diz respeito aos usos da Wikipedia e de dicionários. Ambos são fontes para olharmos como um pontapé inicial e não como algo a se ter efetivamente em um trabalho, a não ser que utilizemos isso para problematizar como o termo foi se complexificando ou como objeto (no caso da wikipedia) ou que não hajam outras fontes para o termo. Confesso que o dicionário me incomoda mais do que a Wikipedia, acima de tudo em trabalhos de nível de pós-graduação. Em caso de dúvida, use com parcimônia, confira em outras fontes e se jogue na problematização do conceito. Um outro problema é quando as pessoas não sabem distinguir um livro teórico de um livro de divulgação científica ou meramente um manual de marketing.
  3. Falta de acompanhamento histórico de uma questão – Se o trabalho tem como central o conceito Z e a pessoa cita o autor Beltrano que trabalhou essa questão em um livro de 15 anos atrás, é preciso conferir se esse Beltrano ou os outros comentadores já não avançaram o conceito ou a questão. Algumas áreas como a cultura digital avançam rapidamente e ver se o autor publicou coisas novas sobre o tema revisando conceitos ou pressupostos é dever de qualquer pesquisador. Não dá para ficar só citando o livro clássico que todo mundo cita e não ver coisas novas.
  4. Não acompanhar a bibliografia estrangeira e não citar os autores nacionais – Existe uma questão que tenho visto sobretudo em trabalhos da área de comunicação e cultura ou mídias digitais que é bastante problemática: o descompasso dos lançamentos de bibliografia. Não adianta, nessa área é preciso ler em língua estrangeira: inglês é básico. Eu nem deveria ter de escrever isso, mas quando vejo uma dissertação ou uma tese sem referências em língua inglesa nessa área, já sei que haverá problemas. Não é questão de se sentir subalterno ou ser colonizado, ou mesmo de achar que o que é feito fora é melhor, não é nada disso, simplesmente não há condições porque no Brasil os livros levam anos para serem traduzidos, isso quando chegam. O descompasso das traduções gera um abismo. Muita coisa é traduzida em espanhol também. Além disso, é preciso avançar e questionar se determinados conceitos/práticas metodológicas efetivamente funcionam em contextos diferentes. Não é porque funcionou nos EUA ou na França que vai funcionar no contexto daqui.  É preciso questionar. Por outro lado, há excelentes trabalhos produzidos no Brasil e observo que muitos ignoram. Talvez não tenham feito um bom estado da arte ou revisão de literatura, mas hoje com Google Acadêmico, bancos de dados online de teses e dissertações, anais de congressos, etc não há desculpas.
  5. Metodologia como mero rótulo demarcador (só para dizer que tem e que segue) –  Confesso que isso me incomoda muito. Prefiro a honestidade de saber como se deu o processo da pesquisa em si, de uma forma direta e até comentando possíveis falhas do que a pessoa que escreve como se tudo ocorresse da forma que os autores dizem porque né, sabemos que nenhuma tese ou dissertação funciona assim calibradinha. Informantes não dão retorno, transcrições são perdidas, sites saem fora do ar, estudos pilotos saem dos trilhos, bolas de neve derretem. Essa percepção da metodologia não pode se distanciar da construção teórica. Acho que essa é a parte mais difícil.

Bom, acredito que tirando minha resmunguice sejam apenas alguns pontos, passíveis de discussão, como tudo na pesquisa, mas que tento manter em mente .