Learning to walk again

Agosto e setembro se despediram e com eles os últimos resquícios de um ano conturbado. Sim, eu conto o ano pelo mês do meu aniversário e não pela troca de calendário. Foi um ano de ligar os pontos e perceber os sinais que a vida estava emitindo. Me perdi pelo caminho,  desviei das rotas mas consegui retomar a estrada. Quem sabe eu não fico boa em recomeçar? São tantas idas e vindas.

A million miles away
Your signal in the distance
To whom it may concern
I think I lost my way
Getting good at starting over
Every time that I return

Houve um momento em que achei que a minha identidade havia escapulido pelo sufocamento cotidiano, pelo excesso de compromissos, pelos do’s and dont’s que a vida nos coloca. Também cheguei a imaginar que pertencia a algo maior, a um grupo e que talvez eu devesse me adaptar “adjust to fit in”.  Era ilusório como todo o resto. Afinal, estou sempre reaprendendo e consequentemente frustrando as expectativas alheias, uma vez que possivelmente nunca vou me adaptar completamente a modelos e padrões pré-determinados pelo senso comum. Me sentia como Dave Grohl nesse vídeo no momento em que ele olha para o lado e vê um adesivo do Bush e olha para o outro e dá de cara com um sticker do Coldplay. Faltava só criar coragem, abandonar o carro no meio do engarrafamento e fazer outra rota a pé.

Learning to walk again
I believe I’ve waited long enough
Where do I begin?
Learning to talk again
Can’t you see I’ve waited long enough
Where do I begin?

Faltava, não falta mais. Por que existem coisas que levam tempo sedimentando, que podem ser sufocadas, mas um dia elas retornam e ai aquela fúria toda emerge exorcizando o passado. Sim, Wasting light é um álbum de exorcismo do que Grohl viveu nos anos 90. Cada um a seu jeito, tambem exorcizo os demônios interiores e novamente aprendo a andar. A vida é assim, feita de rupturas e continuidades, de passagens, de flaneurie, de saber que nada dura para sempre, nem mesmo a chuva fria de novembro. Resgatei as raízes e agora um novo episódio do seriado me aguarda sem nenhum spoiler pela frente.

Do you remember the days
We built these paper mountains
And sat and watched them burn
I think I found my place
Can’t you feel it growing stronger
Little conqueror

RIP R.E.M.

R.E.M nos anos 80

Na quarta-feira, uma das últimas “grandes” bandas do mundo encerrou oficialmente suas atividades através de um comunicado no site. Estávamos no meio da aula da disciplina de Tópicos de Cultura Pop no PPG e ficamos sabendo através do Twitter. Naquele dia não tive tempo de fazer esse comentário aqui no blog, mas o R.E.M representou uma quebra de padrões na metade dos anos 80, trazendo visibilidade ao “college rock” de letras cheias de paisagens e sonoridades não-tão usuais ao rock, embora ainda melódicos e melancólicos. Se hoje existe algo chamado “indie rock” enquanto um gênero boa parte é devido  a essa banda.

Da minha parte escutei muito os vinis de Lifes rich pageant, Document e Green. Quando eles estouraram com Out of Time eu ja havia migrado para o CD e Automatic for the People foi o último que eu efetivamente acompanhei. Em 2004, assisti um show deles em Boston. Foi uma experiência fantástica, embora confesse que tenha curtido ainda mais Morrissey e Pixies, que também assisti no mesmo semestre. Mas até hoje sou capaz de cantar todas aquelas letras – elas devem estar em algum HD mental que eu acesso ao escutar a primeira nota.

Justamente, por coincidência ou zeitgeist?-  nessa semana comentamos – eu e alguns colegas – muito sobre a “marca geracional” dos anos 90. A notícia do término da banda me fez sentir uma certa desolação, aquele murro na cara para confirmar que efetivamente o mundo está muito diferente. É algo estranho já que eu nem ouvia mais tanto a banda e que foi traduzido belamente no texto R.E.M. 1980-2011 escrito pela pesquisadora e fã Nancy Baym.

Abaixo, três de minhas canções favoritas:

 

 

 

“If I would, could you?” Pensamentos aleatórios sobre o revival dos anos 90

Finalmente terminei de assistir à 4a temporada de Californication. Foi uma temporada de altos e baixos, mas os baixos foram tão “fundo do poço” como a vida trash de Hank Moody. Não vou dar spoilers nem fazer resenha. Gostaria apenas de me deter em alguns comentários sobre a importância da trilha sonora e das referências musicais dessa série. São as trilhas que nos conduzem aos recônditos soturnos da mente do protagonista. Especialmente nessa temporada, os anos 90, o tempo diegético no qual Hank e Karen se conheceram – em um episódio da segunda temporada, se não me engano há toda uma lembrança do dia em que Kurt Cobain morreu e como isso foi importante na história do casal – voltou para assombrar o escritor.

Nessa viagem sonora, nós os espectadores fomos conduzidos por alguns clássicos com direito a participações de nada mais nada menos do que Tommy Lee e Zaak Wylde. O primeiro como ele mesmo tocando uma versão “somente piano” de Home sweet home no hotel barato no qual Moody está hospedado. O segundo como vendedor de uma loja de instrumentos musicais no qual Hank e Becca entram para comprar cordas para a guitarra dela, que agora toca na banda “Queens of dogtown”. A ironia não pára ai e não se restringe só às referências musicais.  Vai até o episódio em que Moody coloca um terno preto para ir ao julgamento e comenta: “Pareço um agente do FBI” em um claro intertexto irônico do ator (David Duchovny) com seu mais famoso personagem, agente Fox Mulder do Arquivo X.

Mas o fato é que as narrativas contadas pelas canções pontuam as etapas da narrativa com sensações e percepções extra-seriado e que fazem muito sentido para o público-alvo ideal da série: pessoas que viveram intensamente os últimos momentos do que se convencionou chamar “cena do rock alternativo dos anos 90” e que através dessa nostalgia acessam suas memórias. E aqui entra também uma percepção minha (posso estar errada é só um feeling):  há uma certa ressaca do revival dos 80 que foi usado e abusado por artistas mais pop. É hora de dar um tempo nas ombreiras e nas roupas coloridas. As camisas xadrez estão de volta às vitrines das lojas, os coturnos estão nas ruas e quem sabe os cabelos desgrenhados voltem a ser tendência em breve. Tudo faz parte dos ciclos de nostalgia como forma de consumo, acessando as memórias mais resguardadas de uma certa “Geração X” (aliás, a primeira vez que ouvi esse termo foi nos anos 90), que foi retratada com maestria por Cameron Crowe no clássico filme “Singles” (1992)

E, apesar de estar consciente de que todo esse imaginário faça parte das análises de tendências monitoradas pelas “indústrias da cultura” e caçada pelos coolhunters, de forma muito bem articulada pelas mídias e pela percepção do consumo compartilhado de determinados gêneros no âmago das subculturas, seria hipócrita ao dizer que não me deixei levar pela emoção ao escutar os primeiros acordes de Would do Alice in Chains no episódio da estréia da banda de Becca (senão me engano o 6 ou 7).

Liguei o câmbio automático da nostalgia e pensei: “vivi essas músicas semana a semana na minha adolescência; era exatamente o que eu escutava quando minha vida era menos complicada e a MTV recém havia chegado no Brasil. “. O chamado “meu tempo”, expressão que me fazia rir alto e desdenhava quando proferida por meu pai ou qualquer pessoa com mais de 30 naquela época. Memória e afetos através de artefatos midiáticos. Poderia render um paper, mas prefiro a canção, que certamente ainda ressoará por anos a fio.

Am I wrong?
Have I run too far to get home, yeah
Have I gone?
left you here alone

If I would, could you?